Dorina de Gouvêa Nowill

5 de setembro de 2022 Por: Bárbara Matoso
Foto em preto e branco de Dorina de Gouvêa Nowill. Ela está sorrindo, sentada por trás de uma mesa de madeira, com as mãos apoiadas sobre o móvel. Ao fundo, uma parede clara. Dorina é uma mulher branca de cabelos curtos. Ela usa roupa escura, brincos de pérola, colar, pulseira e anéis. Em cima da mesa, do lado direito, há um telefone do modelo antigo de discar, e do lado esquerdo, uma bolsa.
Fonte: Acervo do Centro de Memória Dorina Nowill.

Dorina Monteiro de Gouvêa, ou Dorina de Gouvêa Nowill, nome de casada pelo qual ficou conhecida a partir de 1950, foi professora e ativista pela educação, prevenção da cegueira, reabilitação e profissionalização das pessoas cegas e com baixa visão. Após concluir o ginásio (1935), foi surpreendida por uma hemorragia ocular e pela perda da visão aos 17 anos de idade (1936). Aprendeu o sistema braille no Instituto de Cegos Padre Chico (SP) (1939) e, por esse sistema, requereu ao Ministro da Educação e Cultura, Gustavo Capanema, a sua licença ginasial, concedida por decreto especial, o qual possibilitou a sua participação no vestibular e o seu ingresso no Curso Normal da Escola Caetano de Campos (SP) (1943). Tornou-se a primeira aluna cega no estado de São Paulo a ser diplomada em um curso público regular de formação de professores (1945). Ainda durante o Curso Normal da Caetano de Campos, compôs um grupo de oito alunas, que desenvolveu um método de ensino para crianças cegas, experimentado em estágios, que resultou: na organização do Curso Experimental de Especialização de Professores para o Ensino de Cegos (1945); no reconhecimento do curso pelo Departamento de Educação do estado de São Paulo; e na habilitação e certificação de especialista para atuarem em escolas no ensino de cegos. O referido curso de especialização foi integrado ao Instituto Caetano de Campos (1948) e, posteriormente, Dorina assumiu a sua coordenação e integrou o seu corpo docente enquanto titular da disciplina de Braille (1955-1966). A sua carreira docente, no entanto, já havia sido iniciada, assim que concluiu o Curso Normal, ao lecionar para crianças cegas no Curso Primário do Instituto de Cegos Padre Chico (SP) (1946) e no Instituto Caetano de Campos nas disciplinas “Metodologia Especial para o ensino de cegos” e “Efeitos psicológicos da cegueira”. Nessa época, Dorina participou com um grupo de normalistas da criação do setor de livros braille da Biblioteca Infantil Municipal de São Paulo (1946), setor esse que recebeu o seu nome no ano seguinte (1947). A biblioteca foi reconhecida como a primeira de iniciativa pública do Brasil a oferecer um serviço especializado aos cegos. Criou a Fundação para o Livro do Cego do Brasil (FLCB) (1946), junto com Adelaide dos Reis Magalhães, com a finalidade inicial de transcrever livros para o braille, e, posteriormente, formar professores e técnicos especializados; difundir conhecimento e práticas sobre e para a educação dos cegos, além de reabilitar pessoas cegas e com baixa visão. Dorina atuou na FLCB como presidente (1951 a 2000) e, na década de 1990, a instituição passou a denominar-se Fundação Dorina Nowill para Cegos (1990-atual). A FLCB recebeu da Kellogg Foundation, em parceria com a Amerian Foundation for Overseas Blind (1948), uma imprensa braille, cuja produção destinou livros para o Brasil e para outros países de língua portuguesa, em resultado de uma visita de Dorina à Kellogg Foundation, em Michigan/Estados Unidos, para tratar do assunto. Durante a presidência de Dorina, a FLCB inaugurou um centro de produção de livros falados e uma biblioteca circulante com envio de livros para cegos de todo país (década 1970). Formou-se no Curso de Especialização em Educação de Cegos pelo Teachers College da Columbia University, em Nova York (1946-1947), e no curso de verão da Michigan State Normal School, em Michigan (1946), com o apoio da União Cultural Brasil – Estados Unidos, por meio de apoio e da concessão de bolsa de estudos pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, pela American Foundation for the Blind e pelo Institute of International Education. Nesse período, participou do Congresso do Conselho Internacional de Crianças Excepcionais, no Canadá (1946). Realizou estágios de observação e visitas técnicas em instituições estrangeiras, inclusive de ensino integrado, como State Comission for the Blind (New Jersey), Perkins Institute for the Blind (Boston, Massachusets), New York Institute for the Blind, Overbrook School for the Blind (Philadelfia), Canadian Institute for the Blind, New York Guild Jewish Blind. Entre as suas diversas ações de repercussão nacional e internacional, intermediou a vinda de Helen Keller, ativista estadunidense surdocega, em missão oficial ao Brasil durante sua viagem pela América Latina (1953); contribuiu para a criação da lei estadual (Lei 2.287/1953) que criou as classes Braille nos cursos pré primário, primário, secundário e de formação profissional no estado de São Paulo. No exercício de cargos públicos na área da educação, desempenhou as funções de Técnica de Educação de Cegos e Supervisora Pedagógica, pelo estado de São Paulo, lotada no Instituto Caetano de Campos. Compôs a comissão executiva da Campanha Nacional de Educação e Reabilitação dos Deficitários Visuais do Ministério da Educação e Cultura (MEC) (1958 a 1960), vinculada ao Instituto Benjamin Constant, primeira política pública nacional de educação dos cegos. Esta Campanha foi renomeada para Campanha Nacional de Educação dos Cegos (CNEC), em 1960, quando passou a ser vinculada diretamente ao MEC. Dorina foi designada diretora executiva da CNEC, cargo que exerceu por 13 anos (1961 a 1973). Compôs os grupos de trabalho de criação e de especialistas do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP) e da Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE), ambos vinculados ao MEC. Enquanto diretora da Campanha Nacional de Educação dos Cegos (MEC), organizou: o Simpósio de Educação Especial, em Brasília (1963); o I Congresso Brasileiro de Educação de Deficientes Visuais (CBEDV), em São Paulo (1964); o II CBEDV, em Brasília (1968) e o III CBEDV, no estado da Guanabara (1971). Além de coordenar o Congresso Mundial e a V Assembleia do Conselho Mundial para o Bem-Estar dos Cegos (1974); e o I Congresso Latinoamericano desse Conselho (1975), ambos realizados em São Paulo. Além da área da educação, atuou em outras frentes na área da prevenção da cegueira, da reabilitação e da profissionalização do cego. Participou ativamente de organizações representativas em âmbitos nacional e internacional, como o Conselho Mundial para o Bem-Estar dos Cegos, inclusive, na vice-presidência (de 1964 a 1969 e de 1974 a 1979) e na presidência (de 1979 a 1984), cargos que a levou a 27 países pela África, Ásia, América, Europa e Oceania, para conferências, encontros de diretorias, visitas técnicas e de campo, em algumas ocasiões representando o Brasil. Ainda, presidiu o Comitê “Latino Americano” desse Conselho Mundial; integrou diretorias do Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos Cegos; do Conselho Internacional para a Educação de Deficientes Visuais; da Associação Brasileira de Educadores de Deficientes Visuais; do Conselho Mundial de Braille; da União Mundial dos Cegos e da União Latinoamericana dos Cegos. Presidiu a Associação de Editoras para deficientes Visuais da Ibero América (ADEVIA) e foi copresidente, junto com Helen Keller, do Comitê Panamericano de Oftalmologia. Compôs a delegação brasileira na Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), no México, em 1975, no Ano Internacional da Mulher, juntamente com Bertha Lutz, em defesa da eliminação da discriminação contra meninas e mulheres com deficiência; e, posteriormente, em 1980, na Assembleia de abertura do Ano Internacional da Pessoa Deficiente (1981), ocasião em que apresentou o seu estudo “A contribuição das pessoas deficientes na sociedade através da participação plena”. Participou da Conferência Mundial sobre Ações e Estratégias para Educação, Prevenção e Integração, em Torremolinos, Espanha, promovida pela UNESCO, representando o Brasil, ocasião em que integrou a Comissão de redação do documento da conferência, conhecido como Declaração de Sundberg (1981). Em termos de publicações, dirigiu a Revista para cegos “Relevo”, criada em 1950, publicada em braille, com conteúdo de artigos de revistas e jornais nacionais e internacionais, além do noticiário da Fundação; e a revista “Relevinho”, destinada a crianças cegas. Também, dirigiu e escreveu os artigos de abertura do periódico “Lente – Revista Especializada sobre deficientes visuais”, fundada em 1957, destinada a professores, oftalmologistas e outros profissionais, publicada na versão em tinta e, posteriormente, em braille. Além dessas, publicou para outras revistas, eventos científicos e organizações associativas, inclusive fora do Brasil. Gravou sua autobiografia, no formato de áudio, em sessenta e seis fitas cassetes, editada posteriormente em livro impresso (1996). Ao longo de sua trajetória recebeu diversos prêmios e condecorações, como a Ordem Nacional do Mérito Educativo (1987), pela Presidência da República brasileira.

Publicações da autora:

NOWILL, Dorina de Gouvêa. … E eu venci assim mesmo. Dorina de Nowill Gouvêa. São
Paulo: Totalidade, 1996.

NOWILL, Dorina de Gouvêa. A criança deficiente visual e a escola pré-primária. Revista
Ciência e Cultura (SP), vol. 20, n.º 2, 1968. p. 482.

NOWILL, Dorina de Gouvêa. Dificuldades encontradas pelas pessoas cegas no processo de
inclusão. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PREVENÇÃO DA CEGUEIRA, 5., 1983,
Curitiba: Associação Paranaense de Oftamologia, Vol. 2. n.º 1, Anais […] p. 20 – 23.

NOWILL, Dorina de Gouvêa. Editoriais. Revista Relevo.

NOWILL, Dorina de Gouvêa. The situation of the blind women. In: TRAINING FOR BLIND

WOMEN IN ASIA, 1981, Kuala Lumpur, Malaysia: Sweden Federation of the Visually
Handicapped. 23March-10April, Proceedings […] p. 79-83.

Referências:

CARDOSO, Fernanda Luísa de Miranda. O Educandário para Cegos São José Operário:
cultura escolar e políticas educacionais – Campos/RJ (décadas de 1960 e 1970). 2018. 245f.
Dissertação (Mestrado em Políticas Sociais). Centro de Ciências do Homem. Universidade
Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Campos dos Goytacazes/RJ.

CARDOSO, Fernanda Luísa de Miranda; MARTÍNEZ, Silvia Alicia. A Campanha Nacional
de Educação dos Cegos: uma leitura a partir da imprensa jornalística dos anos 1960 e 1970. Revista Brasileira de História da Educação, v. 19, p. e051, 18 abr. 2019. DOI: http://dx.doi.org/10.4025/rbhe.v19.2019.e051.

DORINA – Olhar para o mundo. Direção: Lina Chamie. Produção: Girafa Filmes, BD
Distribution, Dezenove Som & Imagens, Mil Folhas Produções Artísticas. Brasil: HBO GO,
2016.

NOWILL, Dorina de Gouvêa. [Entrevista concedida a] Deivison Gonçalves Amaral e Corina
Maria Rodrigues Moreira. História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no
Brasil. Compilado por Mario Cléber Martins Lanna Júnior. Brasília: Secretaria de Direitos
Humanos. Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. 2010. p.
Disponível em: http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/publicacoes/historia-do-
movimento-politico-das-pessoas-com-deficiencia-no-brasil. Acesso em: 3 dez. 2020

AUTORAS:

Fernanda Luísa de Miranda Cardoso
Silvia Alicia Martínez
Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro

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